RIO SAGRADO
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No ventre das Mesas
ouviu-se um gemido
de um ser que quis nascer
e correr serra abaixo
……………
Eras tu, meu Rio Côa,
que querias ser gigante
e escolheste o teu caminho rasgando montes,
dormindo em vales fundos
……………
E, hoje, sou eu que paro junto a ti,
penetro nesse templo sacrossanto do tempo que passou,
e contemplo esse andar tão lento de séculos e milénios
p’ra concluir que quase nada sou
Bernardino Henriques, “Poemas da Terra”, 2009
Eu já conhecia o "ventre das Mesas" e o correr do
Côa serra abaixo. Já conhecia muitos dos seus meandros, já
tinha ouvido os seus lamentos, as suas histórias perdidas, contadas nas
poldras, nas velhas açudes, nas ruínas dos velhos moinhos abandonados no "
tempo que passou ". Mas há muito que me fervilhava a ideia de ligar
esses meandros e essas histórias, de seguir o curso do Côa ... a pé.
Em Junho e Julho de 2010, nas nossas habituais estadias em Vale de Espinho ... iniciei a minha descida pedestre do Côa. A primeira "etapa" foi nos dias 27 a 29 de Junho. E a etapa começou acima da nascente
do Côa, no Lameirão dos Foios, a 1160 metros
de altitude, onde o lençol freático muito próximo da superfície será,
provavelmente, a origem primária dos dois rios irmãos, o Côa
e o Águeda. A Serra das Mesas, já
minha velha conhecida, é bem o ventre de onde eles nascem, ponto de partida
obrigatória desta minha "peregrinação". Depois, foi seguir o curso do jovem
"ser que quis nascer e correr serra abaixo". Contornando o
Cabeço dos Currais e cruzada a estrada do Lameirão, chegamos
aos primeiros declives acentuados e entramos na ampla curva do
Prado da Barrosa. Do curso sul/norte que o caracteriza na
generalidade, nos Foios o Côa corre no sentido nordeste/sudoeste. Primeiros
lameiros, primeiros campos de cultivo ... e estamos nos
Foios.
Logo a seguir aos Foios, o Côa recebe os seus dois primeiros afluentes
propriamente ditos, na margem esquerda: os ribeiros do
Colmeal e do Picoto.
Cama Grande ... e os granitos vão dando lugar aos xistos ...
a Serra das Mesas vai dando lugar à da Malcata. Chegamos à
Fontanheira, aos pés do
Cabeço do Canto da Ribeira, às Colesmas, às
Braciosas. As velhas açudes, as poldras para atravessar o
rio,
começam a soltar-me o gemido do "tempo que passou ", das gerações que
as águas viram passar, do labor dessas gerações.
Nas Braciosas, o rio entra em terras de Vale de Espinho, contornando os Cabeços da Cruz Alta e do Pisão. Surgem os primeiros moinhos ... ou o que resta deles.
Primeiro o Moinho do Sr. Vital, depois o
Moinho dos Pecas.
Passada a ribeira dos Abedoeiros, chegamos às Veigas ... e ao Engenho. Antigo moinho, antiga fábrica de mantas, antiga "fábrica de luz", o Engenho vale só por si um compêndio de história, de memórias, de grandezas e fracassos. Quantas páginas ali se escreveram da história e da vida das gentes de Vale de Espinho e da raia...
Pouco depois chegamos à velha Ponte, ícone de Vale de
Espinho. O Moinho do Ti Xico Barbeiro é dos poucos na margem
esquerda. E seguimos para o Pisão, a foz da ribeira do
Vale da Maria, o Moinho do Ti Zé Lucas e o
da Nogueira. Das Aleguinhas e do
Freixial, que viu tantos e tantos convívios nos anos 60, 70,
80, já quase não restam vestígios, varridos pelo envelhecimento e pela
desertificação. Em qualquer destes lugares, vem-me sempre à memória o
pensamento de Sérgio Paulo Silva, também ele "filho adoptivo" de Vale de
Espinho, da raia, da Malcata, do Côa. Escrito para uma
minha foto do Moinho do Rato
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Em Junho e Julho de 2010, nas nossas habituais estadias em Vale de Espinho ... iniciei a minha descida pedestre do Côa. A primeira "etapa" foi nos dias 27 a 29 de Junho. E a etapa começou acima da nascente
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Abutre de asas abertas, porque não me dás boleia?... Lameirão dos Foios, Serra das Mesas, 27.06.2010 |
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Atravessando o prado da Barrosa, 28.06.2010 |
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Praia fluvial dos Foios, 28.06.2010 |
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Pontão e Moinho dos Pecas (vista de nascente), 29.06.2010 |
Nas Braciosas, o rio entra em terras de Vale de Espinho, contornando os Cabeços da Cruz Alta e do Pisão. Surgem os primeiros moinhos ... ou o que resta deles.
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Memórias que a memória não esquece... |
Passada a ribeira dos Abedoeiros, chegamos às Veigas ... e ao Engenho. Antigo moinho, antiga fábrica de mantas, antiga "fábrica de luz", o Engenho vale só por si um compêndio de história, de memórias, de grandezas e fracassos. Quantas páginas ali se escreveram da história e da vida das gentes de Vale de Espinho e da raia...
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A velha ponte de Vale de Espinho há muito que vê passar o Côa! |
"E de repente damo-nos conta que envelhecemos, a ver envelhecer estas pedras
que não envelhecem."
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Pontão das poldras, no Moinho do Rato, 18.07.2010 |
Mas o Côa segue o seu curso. À margem do
Cabeço do Colmeal, deixa o
Moinho dos Pereiras, ou da Ponte Nova, a
ponte nova que um dia viu passar a estrada que levaria a Malcata, mas que
termina no Alcambar.
E precisamente junto à foz da ribeira do Alcambar, descansam os restos da última obra da arte da água e da pedra* nos limites de Vale de Espinho, o Moinho da Ervaginha.
13/09/2011
E precisamente junto à foz da ribeira do Alcambar, descansam os restos da última obra da arte da água e da pedra* nos limites de Vale de Espinho, o Moinho da Ervaginha.
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Moinho da Ervaginha e lameiros do Côa, Vale de Espinho (clique neste link para ver o álbum completo) |
"Etapa" da descida pedestre do Côa entre a nascente e a barragem do Sabugal, que inclui o troço descrito neste post |
1 comentário:
Parei a descansar a vista no moinho da Ervaginha...
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