De 7 a 10 de Junho de 2008, levei os Caminheiros Gaspar Correia ao
Parque Nacional da Peneda-Gerês. Já os tinha levado a dois dos meus três "berços": a Malcata e Somiedo. Faltava o Gerês!
Mas a organização de uma actividade para a minha "família" Caminheira implicava algumas dificuldades e desafios: por um lado, a maioria dos percursos mais belos e "selvagens" implica uma extensão e/ou um grau
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Chã do Monte, Serra da Peneda, 7.06.2008 |
de dificuldade que não é acessível a diversos elementos do grupo; por outro lado, o acesso às zonas mais recônditas dificulta ou inviabiliza de todo as deslocações em autocarro. Assim, naquela actividade, quis dar-lhes de certo modo uma amostragem das diversas zonas do Parque Nacional, nas suas duas principais vertentes: a paisagística e natural (a fauna e flora típicas, a geologia) e a etnográfica (a ruralidade, as tradições, a cultura). Para aqueles 4 dias, elegi 4 caminhadas em áreas distintas do Parque Nacional: a Serra da Peneda, a Serra do Soajo, o vale da Teixeira, como "postal" da Serra do Gerês, e, por fim, em área limítrofe, a Ponte da Misarela.
Pouco depois da hora do almoço do dia 7 de Junho, estávamos assim em plena
Serra da Peneda, para fazer a
travessia da branda da Bouça dos Homens à Senhora da Peneda, pela Chã do Monte e descendo junto à fraga da Meadinha. Uma caminhada curta, de menos de 5 km, mas fabulosa, baseada na caminhada que eu havia feito em
Março de 2007.
Começando sensivelmente aos 1000 metros de altitude, ascendemos por um carreteiro por onde antes passavam os carros de bois que ligavam a
Bouça dos Homens à
Senhora da Peneda. Rapidamente o carreteiro transforma-se num antigo caminho de pé-posto, de romeiros devotos à imagem da Senhora da Peneda. Dois quilómetros depois (e já acima dos 1100 metros), estávamos aos pés da
Penameda, com
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A caminho de Bostelinhos, Serra do Soajo, 8.06.2008 |
uma panorâmica que se estende da branda que deixámos para trás ao vale da
Gavieira, a sul. Aí começou a descida, aproximando-nos da
Chã do Monte; esta represa servia uma mini-hídrica que, há anos atrás, fornecia a energia eléctrica ao povoado da Peneda. Cruzado o lago, a descida é espectacular, observando-se lá no fundo a igreja e o aldeamento da Peneda, assim como, do lado esquerdo, a Fraga da Meadinha, procurada por inúmeros escaladores nacionais e estrangeiros.
O
Hotel da Peneda recebeu-nos nessa noite, para no dia seguinte rumarmos à
Serra do Soajo, por Rouças, Tibo e Adrão, direitos ao núcleo megalítico do
Mezio, onde íamos iniciar a 2ª caminhada:
do Mezio à branda de Bostelinhos e desta a Vilela de Lajes e Boimo.
Iniciámos o trilho por entre um bosque misto de vidoeiros, pinheiros bravos, pinheiros silvestres e cedros, que rapidamente nos conduziu a um planalto coberto de vegetação rasteira, constituída por urzes e tojos.
Ao alcançarmos uma pequena elevação, a panorâmica abre-se até ao rio
Lima e a Arcos de Valdevez. Iniciámos então uma descida por um carreteiro que nos conduziu a Vilela de Lajes, para depois seguirmos para montante da
ribeira de Vilela por um denso bosque de carvalhos. Seguiu-se a subida para
Bostelinhos; ao alcançar os primeiros cortelhos do lugar, atravessámos a ribeira e entrámos na branda, onde invertemos caminho em sentido descendente, por entre os socalcos, para atravessarmos novamente
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Barragem da Caniçada, da Pedra Bela, 9.06.2008 |
a ribeira de Vilela, à beira da qual almoçámos. Depois, do rústico e bucólico lugar de
Vilela de Lajes, a partir do núcleo de espigueiros, seguimos por um caminho que, por entre muros de pedra solta, nos conduziu até ao pequeno lugar de
Boimo … onde nos esperava o autocarro, na estrada para
Arcos de Valdevez. As duas noites seguintes foram na Pousada de Juventude de Vilarinho das Furnas. Na porta do Parque Nacional, visitámos a exposição etnográfica alusiva à aldeia "perdida" de
Vilarinho da Furna.
Mas a caminhada mestra desta actividade com os Caminheiros foi a do dia 9 de Junho. Ligando dois dos pontos mais turísticos do Gerês - o miradouro da
Pedra Bela e a
Cascata do Arado - levei o grupo ao coração da Serra do Gerês, a um dos mais recônditos e desconhecidos lugares deste paraíso natural: o
vale da ribeira de Teixeira!
Por entre pinhais, começámos por acompanhar parte do PR3, até ao Curral da
Carvalha das Éguas, onde os horizontes se abrem para oeste, numa panorâmica que tem por pano de fundo as alturas da
Junceda e da
Calcedónia. Continuando a ziguezaguear em permanente sobe e desce (mais sobe do que desce…), o nosso destino inflectiu depois para leste. Já acima dos 1000m de altitude … eis que os nossos olhos descobrem o autêntico "
Shangri-la" do
vale da Teixeira. Como no “Horizonte Perdido” de James Hilton ... "
o tempo parece deter-se em ambiente de paz e felicidade". Aqui habitualmente pastam garranos em liberdade. E, como pano de fundo, por trás do vale, a mole imensa do maciço do
Borrageiro.
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Descida para o Shangri-la do Vale da Teixeira, 9.06.2008 |
Descida a encosta e atravessada a ribeira, estávamos junto à cabana que me havia protegido em Março.
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Prado e cabana da Teixeira, local de almoço, 9.06.2008 |
Foi aí o almoço ... e foi aí também a opção para quem quis aventurar-se a subir ao Borrageiro! Em Março não tinha chegado ao Borrageiro, devido à chuva, mas tinha o registo GPS da descida com o CAAL, em
Julho de 2005. Um grupo de quase 20 "destemidos" seguiu-me então pelo vale da Teixeira, subindo ao
Curral do Camalhão e deste à
Chã da Presa. No início da subida, ainda junto ao rio do Camalhão, por momentos perdi o trilho ... e obriguei os meus seguidores a um "aventuroso" corta-mato ascendente...
J! Contudo, mesmo depois de reencontrado o trilho, o grupo teve algumas "baixas". Da
Chã da Fonte ao
Borrageiro já só éramos 14 ... que às 14:40h daquele dia 9 de Junho "conquistámos" os 1430 metros de altitude do Borrageiro.
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Subida ao Borrageiro, 9.06.2008 |
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Os 14 "destemidos" no cume do Borrageiro, 1430m alt., 9.06.2008 |
A panorâmica do alto do Borrageiro é sempre espectacular, estendendo-se das serras da Peneda, Soajo e Amarela, a oeste, às moles graníticas do Gerês, a leste e nordeste; para sul e sueste, o maciço das Rocas, próximo, e a serra da Cabreira, ao fundo.
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Cascata do Arado, 9.06.2008 |
Regressando ao
Camalhão e ao prado da
Teixeira, reunimo-nos com os que tinham ficado no repouso, seguindo depois caminho rumo ao Arado. Uma vez chegados à "mariola gigante" … dava-nos vontade de voar! Atrás de nós, para norte, tínhamos o vale da Teixeira, o "
Shangri-la" acabado de atravessar; aos nossos pés, para sul, a vertente abrupta do vale do
Arado. Ziguezagueando ao longo de cerca de 2 Km, ora nos aproximávamos das primeiras "piscinas" e cascatas do rio Arado, ora cruzávamos pequenos afluentes, como a
Corga da Giesteira. Lá em baixo, começámos a ver a ponte do Arado ... e estávamos no final da caminhada!
Restava o quarto e último dia, 10 de Junho. Em dia de regresso a Lisboa, impunha-se uma caminhada curta. Programei a pequena caminhada de descoberta da Ponte da Misarela, em versão mais curta do que a que tínhamos feito em Março. Começámos na aldeia de
Frades, abaixo de Ruivães, no vale do
Cávado. Na outra margem, avistavam-se pequenas povoações da encosta sul do Gerês, como
Fafião e
Pincães. É um muito bonito troço rural, entre muros cobertos de musgos e campos de cultivo. Com pouco mais de 2 km percorridos, cruzámos a estrada e apontámos então à
Ponte da Misarela, ou Ponte do Diabo, sobre o rio Rabagão, ligando terras minhotas a terras transmontanas … e contando-nos velhas lendas cheias de história, de crenças e de tradições populares, a que já aludi quando da primeira incursão, em
Outubro de 2006.
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Ponte da Misarela, ou do Diabo, 10.06.2008 |
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As águas revoltas do Rabagão, junto à Ponte da Misarela |
É tradição muito antiga nas populações circunvizinhas que, quando algo ia mal na gravidez, a mulher se dirigisse à ponte e debaixo dela pernoitasse, na expectativa de ajuda celeste para o seu problema. Na sequência da operação, a primeira pessoa que atravessasse a ponte no dia seguinte seria o padrinho ou madrinha da criança, à qual seria posto o nome de Gervaz, se rapaz viesse ao mundo, ou de Senhorinha, se de rapariga se tratasse. E isto para que, por obra e graça do pré-baptismo, a mulher tivesse um bom sucesso na sua gravidez.
A caminhada terminou em
Sidrões. Uma boa costeleta barrosã foi o prato principal de um almoço que encerrou a actividade caminheira, despedindo-nos do Parque Nacional junto à estreita ponte sobre o rio
Cávado, entre Sidrões e Cabril.
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Despedida do Parque Nacional da Peneda-Gerês, 10.06.2008 |
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