Ninguém pode construir por ti as pontes que vais precisar de passar para atravessares o rio da vida. Ninguém, excepto tu, só tu. Existe certamente um sem número de atalhos e de pontes, semideuses que se oferecerão para te levar para além do rio, mas isso custar-te-ia a essência de ti próprio: hipotecavas-te e perdias-te. No mundo só existe um único caminho, por onde só tu podes passar. Aonde leva? Não perguntes, segue-o!
O blogue "Por fragas e pragas..." nasceu no dia 9 de Janeiro deste "ano da graça" de 2011, quando das comemorações do centenário do velho Liceu Passos Manuel. Em 9 MESES e nos 147 ARTIGOS publicados, recordei e revivi 40 anos de "aventuras" ... de fragas e de pragas, de 1970 a 2010. A corrida das memórias atingiu assim a meta do ano corrente! O "rapaz pacato" que iniciou esta viagem é hoje quase sexagenário ... mas mantém a paixão e a garra que cada vez mais o inspira e alimenta. Nos "paraísos perdidos" das suas serras e rios, nas suas três "terras natais", o nosso jovem, agora avô, continua a subir velhas bredas, a beber a água divina das fontes, a sentir a energia telúrica de escarpas e barrocos, a descer torrentes e ribeiras, a pulular de som e de vida … saltando as fragas. Quem sabe se as águas que hoje vê ainda são as mesmas que já viu antes ... as mesmas que ainda espera vir a ver.Friedrich Nietzsche
Se for possível alguma metáfora, poderei arriscar que a "Fraga" que o Sebastião Antunes canta - nos "Contos de Fragas e Pragas" que inspiraram o título do blogue - é o "barroco sagrado" das minhas Fontes Lares, a Brazalite da "aldeia mágica" de Pitões das Júnias, a Peña Furada de Valle de Lago, nas "terras mágicas" de Somiedo ... ou tantas outras. As "lendas perdidas do pó das pedras" ou os "contos aprendidos à lareira quase apagada" ... são as memórias eternizadas na pedra da velha casa das Fontes Lares, são contos de amores e desalentos, são as lendas perdidas da Marvana, da esbelta "Rosa da Montanha", das cabanas perdidas nos currais do Gerês, das xanas e nuberus que se escondem na ramagem dos bosques de Somiedo, histórias de brañas e vaqueiros, de homens e de luta. As águas que brilham à luz da "Lua branca das ribeiras" ... são as águas do meu Côa, do alto Homem e das corgas do Gerês, do Pigueña e das torrentes de Somiedo ... e de tantas outras. À medida que escrevo e que sonho, no meio do silêncio ... estou a escutá-las...
E como "No canto de cada sonho nasce a vontade" ... este blogue vai continuar, agora acompanhando o presente. Os 40 anos aqui revividos ... foram a génese do que o "rapaz pacato" é hoje, pai, marido, avô ... mas apaixonado como sempre pelos paraísos perdidos que teima em desbravar. A acompanhá-lo ... a mesma companheira de sempre. Não necessariamente em todas as "aventuras", mas na grande maioria, e, principalmente ... na grande aventura da vida. Obrigado, companheira!
Enquanto tiver vida e forças ... é a caminhar que quero mostrar a mim próprio quem sou e o que sou. Há quem defenda que caminhar solitariamente é um risco. Tudo na vida é um risco...! Há que saber doseá-los. A tecnologia permite hoje que ninguém se perca em sítio nenhum do planeta, desde que se saiba usar os meios que aquela põe ao nosso alcance. Apesar de um bom sentido de orientação, não me meteria em várias das "aventuras" em que actualmente me meto sem recorrer ao GPS, que contudo é um simples PDA com o meu fiel OziExplorer instalado. Cartas pormenorizadas e georreferenciadas (e/ou imagem Google Earth), bateria(s) suplementar(es) consoante a duração da "aventura" ... e a progressão no terreno é acompanhada no aparelho, segundo a segundo, metro a metro. E não há imprevistos? Claro que há ... mas a vida é um imprevisto e um risco permanente, em qualquer lugar, em qualquer momento.
Pegando nos "Diários" de Miguel Torga ... ouso identificar-me com alguns dos seus escritos. Ouso até adaptar o primeiro dos pensamentos que transcrevo:
Pareço um doido a correr estas serras, estes rios e estes vales. Do Gerês à Malcata, do Côa ao Homem, das terras de riba-Côa às terras de Somiedo, não tenho sossego. "Talvez, sem eu ter consciência disso, cultivo-me assim pelos olhos e pelos pés, no alfabetismo íntimo das cousas, expressivas na sua luz, no seu clima e no seu paralelo particular. A terra não é igual em lado nenhum. Aqui encolhe-se, ali espalma-se, acolá afunda-se...O presente post é simultaneamente o último ... e o primeiro de um novo blogue, ou melhor, do rejuvenescimento que assinala o seu cruzamento com a actualidade. Depois, o "novo" blogue contará as "aventuras" já vividas este ano. Ao contrário dos anteriores, retrospectivos, os respectivos artigos foram escritos na altura ... só não foram publicados. Se o fossem, misturar-se-iam com os anteriores, confundindo a sequência cronológica. Foram por isso guardados, à espera que as fragas do passado chegassem às fragas do presente. Vão agora conhecer a luz do dia, pausadamente, mas com a data das "aventuras" a que reportam e/ou em que foram escritos.
Devoro planícies como se engolisse bolachas de água e sal, e atiro-me às serranias como a broa da infância. É fisiológico, isto. Comer terra é uma prática velha do homem, antes que ela o mastigue, vai-a mastigando ele."
E como " a vida é feita de pequenos nadas " ... as coincidências e as fragas da vida fizeram com que um blogue, nascido no dia de um almoço que reuniu gente do meu velho Liceu Passos Manuel, onde fui aluno … acabe curiosamente, na sua parte retrospectiva ... no dia de um jantar que vai reunir mais de meia centena de ex-alunos meus, que viveram comigo tantas e tantas "aventuras" partilhadas em conjunto!
O "velho" blogue, que reviveu 40 anos de "aventuras", claro que se vai manter online, mas termina portanto com este post, dando lugar ao "novo", ao blogue das fragas e pragas do presente. Os 40 anos de fragas e pragas ultrapassaram as 15 mil leituras! A todos os que tiveram a paciência de me acompanhar ... bem hajam! Continuem a acompanhar-me no novo endereço http://porfragasepragas.blogspot.com/. Primeiro as fragas já vividas em 2011 ... e depois "em directo"... J!
"Fraga", "Contos de Fragas e Pragas", Sebastião Antunes, "Quadrilha", 1992
23 de Setembro de 2011